domingo, 22 de junho de 2025

O Diário do Fogo de São João

Era para ser só mais um trabalho escolar.

Helena, professora de História, garimpava ideias para o arraial da escola quando encontrou, entre os livros empoeirados do arquivo da biblioteca municipal, um caderno encadernado com couro e cheiro de mofo e fumaça. No topo da capa, em letras quase apagadas, lia-se: “Memórias do Fogo de São João – 1693”.
Curiosa, ela abriu. A primeira frase fez seu coração disparar:

> “Hoje dançamos em volta da fogueira não só por São João, mas porque aqui, tão longe de Lisboa, o povo ainda precisa de alegria para aguentar a colônia.”

E então, como num feitiço junino, Helena não leu: ela entrou.

De repente, estava em pleno século XVII, no pátio de uma fazenda colonial no interior do Brasil. O chão era de barro batido, os lampiões tremulavam ao vento e as pessoas usavam roupas rústicas, feitas de linho e algodão cru. Ao centro, uma enorme fogueira estalava. Um padre jesuíta tocava rabeca, e as crianças dançavam em roda.

Ela entendeu tudo: ali se misturavam a fé trazida de Portugal, o milho plantado pelos indígenas, e o batuque dos tambores herdados da África. Cada prato da mesa – canjica, pamonha, bolo de fubá – era uma história de resistência e adaptação.
“Essas festas nos lembram que, mesmo longe da terra natal, podemos celebrar a vida”, dizia o diário, agora em voz alta, como se sussurrasse ao ouvido de Helena.

Ela voltou para a biblioteca com o cheiro da lenha na roupa e o coração aceso. Na festa junina da escola, não se limitou à dança da quadrilha: criou um “Arraial da História”, onde cada barraca contava um capítulo daquela tradição — da Europa medieval aos terreiros brasileiros.

E enquanto as crianças pulavam a fogueira cenográfica, Helena sorriu: sabia que a verdadeira fogueira estava acesa dentro delas.

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